L’autogestion au Brésil:
  La viabilité economique des enterprises gerées par des ouvriers.
José Ricardo Tauile (1)
  Eduardo Scotti Debaco (2) 
  Sommaire
L’economie populaire solidaire (difficult to translate to English) is 
  at the same time a productive segment and a social movement. The enterprises 
  that participate in it are self-managed commercial or civil societies. In the 
  last few years, self-management has started to bring important contributions 
  to the Brazilian society, and has a great potential in the long run, especially 
  in terms of counteracting effects economic crises. 
  In terms of the corresponding recognition from pubic powers, the last government 
  of the State of Rio Grande do Sul was the first to firmly act in this direction 
  – it had a specific fostering program of Economia Popular Solidária, 
  located in its Development and International Affairs Secretary (SEDAI) – 
  and has been followed nowadays at the Federal level, by the creation of a Secretary 
  for “Solidaire” Economics (Economia Solidária) within the 
  Ministry of Labour. The experience of that Brazilian State, from 1998 to 2002, 
  involved hundred of enterprises that were created out of bankrupt business or 
  from the reunion of unemployed workers in a region. 
  Many were the difficulties to make functioning such type of (self-managed) enterprises 
  but there were quite remarkable achievements either on the part of worker’s 
  maturity to manage democratically their businesses, or on the part of State 
  authorities prone to support and foster such sort of collective entrepreneurship. 
  The success of deepening and diffusing more widely such process depends on a 
  greater involvement of society as a whole to properly equate the difficulties 
  with the possibilities of overcoming them in a coordinated manner. 
  
  AUTOGESTÃO NO BRASIL:
  A VIABILIDADE ECONÔMICA DE EMPRESAS GERIDAS POR TRABALHADORES
  José Ricardo Tauile
  Eduardo Scotti Debaco
RESUMO
A economia popular solidária é, ao mesmo tempo, um segmento produtivo e um movimento social. Os empreendimentos que dele participam organizam-se sob a forma de sociedades comerciais ou civis autogeridas. A autogestão vêm trazendo importantes benefícios para sociedade brasileira mas nem sempre recebe dela e do poder público a devida atenção . Não obstante, muitos avanços vêm sendo obtidos tanto na maturidade dos trabalhadores para administrarem negócios coletivos quanto dos governos em apoiá-los. O aprofundamento deste processo depende de um maior envolvimento da sociedade como um todo no sentido de caracterizar melhor as dificuldades encontradas, propor soluções e coordenar esforços.
  INTRODUÇÃO
Ao mesmo tempo que a atual revolução tecnológica traz 
  um aumento da eficiência e da capacidade produtivas, observa-se o crescimento 
  dos índices de desemprego, subemprego e informalidade. Resulta daí 
  que setores da sociedade para os quais não se tinha políticas 
  públicas que fossem além da assistência social, começam 
  a encontrar na economia popular solidária e na autogestão uma 
  possibilidade para melhorar sua qualidade de vida.
  
  Apesar da multiplicidade de conceitos, por ora podemos caracterizar economia 
  popular solidária como o conjunto de empreendimentos produtivos de iniciativa 
  coletiva, com um certo grau de democracia interna e que remuneram o trabalho 
  de forma privilegiada em relação ao capital, seja no campo ou 
  na cidade. Já a autogestão, da forma que costuma ser utilizada 
  na ainda incipiente literatura, aparece mais como um ideal de democracia econômica 
  e gestão coletiva a ser perseguido do que como uma possibilidade prática. 
  Assim, costuma-se chamar de empresa de autogestão àquela que tem 
  iniciativas concretas neste sentido e situa-se dentro de um patamar mínimo 
  de organização. Neste texto trataremos principalmente de empreendimentos 
  autogeridos cuja atividade econômica faça parte da indústria 
  de transformação. Em qualquer dos casos, é fundamental 
  diferenciar este movimento social do cooperativismo tradicional. Enquanto o 
  segundo, no Brasil, tem sido uma forma de precarização das relações 
  de trabalho, o primeiro é uma reação mais ou menos organizada 
  a este processo. Essa forma de organização pode ser uma alternativa 
  efetiva ao trabalho precário encontrada tanto por pequenos grupos quanto 
  pelo conjunto de trabalhadores de uma fábrica de médio ou grande 
  porte e, às vezes, por toda uma comunidade ou município.
  
  Num movimento dialético, a crescente quantidade de empresas autogeridas 
  associadas à ANTEAG (Associação Nacional de Trabalhadores 
  em Empresas de Autogestão e Participação Acionária), 
  entidade precursora do movimento de autogestão urbana no país, 
  é um legado da década de 90, período em que as mais ortodoxas 
  políticas neoliberais foram aplicadas no Brasil (e em muitos outros países 
  em desenvolvimento). Tolerar ou mesmo estimular a formação de 
  empreendimentos alternativos aos padrões capitalistas normalmente aceitos, 
  tais como cooperativas autogeridas é, objetivamente falando, uma forma 
  de reduzir o passivo corrente que se materializa em ondas de crescentes desemprego 
  e falências (ver SANTOS, 2002).
  
  Tais empreendimentos encontram potencialmente no trabalho coletivo e na motivação 
  dos trabalhadores que os compõem, uma importante fonte de competitividade 
  reconhecida no capitalismo contemporâneo. Enquanto no fordismo a competitividade 
  é obtida através das economias de escala e de uma crescente divisão 
  e alienação do trabalho associadas a linhas produtivas rígidas 
  – automatizadas ou não -, na nova base técnica que está 
  se configurando, uma importante fonte de eficiência é a flexibilização. 
  O chamado modelo japonês, estabeleceu os novos e bem sucedidos padrões 
  de organização (social) da produção no o capitalismo 
  contemporâneo. Nele, busca-se recuperar a motivação e a 
  participação, devolvendo, em certo sentido, ao trabalhador uma 
  parte do conhecimento sobre a produção que lhe vinha sendo expropriado 
  desde o início do capitalismo produtivo – e moderno (TAUILE, 2001-b). 
  
  
  A autogestão, apesar de não ser uma idéia nova, pode ser 
  vista hoje, como uma radicalização deste processo de devolver 
  ao trabalhador parte daquilo que o capitalismo lhe foi tomando ao longo de séculos. 
  Ao se recuperar coletivamente o saber produtivo, por exemplo, se está 
  dando um passo na direção de reduzir ou mesmo, no limite, superar 
  o que Marx chamou de subsunção real do trabalho; ao criar formas 
  de propriedade coletiva do capital está se propondo a superação 
  da subsunção formal do trabalho e quiçá, no limite, 
  do próprio capitalismo.
  
  Na prática, porém, a autogestão no Brasil, ainda em estágios 
  iniciais, enfrenta todo tipo de dificuldades. Muitas delas são bastante 
  diferentes daquelas com que se deparam as empresas convencionais. A rigor, entretanto, 
  não se pode dizer a priori, que as chances de sucesso das empresas de 
  autogestão sejam menores ou maiores. Muitas delas venceram em terrenos 
  onde as empresas tradicionais fracassaram. Este mérito, porém, 
  nem sempre é devidamente reconhecido. A verdade é que ainda quando 
  a autogestão mostra-se mais eficiente, enfrenta-se uma série de 
  preconceitos, inclusive por parte de órgãos públicos.
  
  São inegáveis os problemas decorrentes de trabalhar com os “restos 
  do capitalismo”. As empresas de autogestão são formadas 
  por pessoas que não possuem grande patrimônio pessoal e, normalmente, 
  têm um reduzido grau de instrução. Mesmo quando estas empresas 
  têm à disposição equipamentos para trabalhar, estes 
  costumam ser antigos e, muitas vezes, obsoletos. A falta de patrimônio 
  faz com que a empresa nasça com uma estrutura de capital deficiente e 
  que freqüentemente a necessidade de capital de giro seja superior à 
  sua capacidade de financiá-lo. Outro problema está relacionado 
  à falta de instrução formal dos cooperativados e, particularmente, 
  daqueles que ocupam os cargos de direção. Não obstante 
  o conhecimento prático e tácito que estes trabalhadores tenham 
  do processo produtivo em si, a sua carência de conhecimentos técnicos 
  e de experiência em questões mercadológicas, bem como macro-institucionais, 
  agrava as dificuldades naturais para se construir um quadro de administradores 
  com competência adequada àquelas novas (e inovadoras) situações..
  
  Pelo lado positivo, a autogestão traz potencialmente uma série 
  de vantagens e protege o negócio de certos riscos que as empresas convencionais 
  correm. Estar trabalhando num negócio que é seu e do qual o trabalhador 
  participa das decisões permite uma motivação maior apesar 
  das adversidades. Por serem proprietários, mas somente quando começam 
  a sentir-se como tal (o que não é trivial), os trabalhadores buscam 
  conhecer melhor o negócio, com reflexos positivos sobre suas atividades. 
  
  
  Outra fonte de eficiência nada desprezível diz respeito à 
  transparência na gestão, pois ela reduz as possibilidades de fraudes 
  contra a empresa e de desleixo pelos administradores; não custa ressaltar 
  que comportamentos destes tipos causam falências de sólidos negócios, 
  muito mais freqüentemente do que se possa imaginar. Resulta por sinal mais 
  um benefício para sociedade, além da geração, direta 
  e indireta, de trabalho e rendajá que, muitas vezes, o plano de auferir 
  vantagens pessoais beneficiando-se do direito comercial e da lei de falências, 
  por parte de empresários, é frustrada devido à ação 
  dos trabalhadores inspirados pela autogestão.
  
  Na experiência brasileira, as empresas autogeridas apresentam graus bastante 
  diversos de eficiência. Mesmo que apenas um grupo restrito possa apresentar 
  desempenho econômico-financeiro excelente, estes empreendimentos têm 
  o mérito de gerar ou preservar postos de trabalho e renda a um custo 
  bastante reduzido. Assim, há questões que parecem importantes 
  de suscitar sobre a viabilidade econômica destes empreendimentos :
1. O que deve-se entender por eficiência econômica analisando-se 
  para além da simples questão do lucro no curto prazo?
  2. Até que ponto a sociedade deve apoiar estes empreendimentos, ou quando 
  deve-se julgar que eles sejam necessários? Que instrumentos usar ?
  3. Podem as empresas de autogestão ser eficientes independentemente da 
  ação do Estado? Seria possível determinar condições 
  necessárias para isso?
  4. Em que casos a ação do Estado seria desejável? Como 
  políticas públicas voltadas para estes empreendimentos podem viabilizar 
  iniciativas que, de outra forma, não sobreviveriam?
A proposta apresentada aqui é de discutir a validade das experiências 
  de autogestão a partir de aspectos internos à firma. Isto não 
  quer dizer que as questões referentes à economia solidária 
  como forma social de organização da produção sejam 
  descartadas. Ao contrário, tais aspectos, apesar de fugirem ao escopo 
  do artigo proposto, servem de importante pano de fundo sobre o qual este se 
  desenrola. Afinal, não se entende construir uma autêntica economia 
  solidária sem empreendimentos autogeridos e sustentáveis; deste 
  modo a questão colocada é como, quando e por que viabilizá-los 
  .(3)
  
  O objetivo deste artigo é apontar linhas de pesquisa que propiciem o 
  entendimento de como as políticas públicas podem melhorar as oportunidades 
  de sucesso dos empreendimentos brasileiros de autogestão? A partir disso, 
  espera-se que seja possível desenhar ferramentas com as quais estas empresas 
  possam enfrentar de forma mais precisa e eficaz suas dificuldades. Como, então, 
  redefinir tais instrumentos (por exemplo, linhas específicas de financiamento 
  e fundos de aval), dotando-os de características que permitam ampliar 
  sua abrangência e impacto sociais. Outro aspecto importante a destacar 
  é a expectativa de que a disponibilização e a sistematização 
  de informações permitam superar o preconceito contra estas empresas 
  por parte de fornecedores e instituições financeiras.
  
  Políticas públicas que têm por objetivo concretizar estas 
  vantagens potenciais começam a surgir nas esferas municipal e estadual. 
  Tais políticas enfatizam aspectos como o trabalho em rede, incentivos 
  ao comércio solidário, formação e capacitação 
  técnica dos trabalhadores e crédito. Falta, todavia, um conhecimento 
  mais aprofundado da realidade que vivem estas empresas e faltam também 
  mecanismos legais e institucionais que tornem estas políticas mais efetivas. 
EXPERIÊNCIAS DE AUTOGESTÃO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO : TEORIA E PRÁTICA
A ANTEAG define a autogestão como o controle dos meios de produção 
  e da gestão pelos trabalhadores (ANTEAG, 2000). Dado o grau de instrução 
  formal geralmente baixo dos operários, a gestão democrática 
  do negócio está no centro das preocupações pois 
  estes têm, via de regra, habilidade para produzir mas encontram fortes 
  dificuldades em gerir seus negócios. Já o aspecto controle dos 
  meios de produção também apresenta dificuldades significativas 
  de ordem legal e financeira. Neste caso, os trabalhadores enfrentam uma dificuldade 
  crônica: a falta de recursos próprios (ANTEAG, 1998). 
  
  Sem dispor de patrimônio pessoal que permita a integralização 
  de capital social significativo, o patrimônio líquido (4) 
  da empresa inicia com valores praticamente simbólicos. O negócio 
  começa, portanto, com fortes dificuldades de financiamento de suas atividades, 
  com limitações para investir, defasado tecnologicamente, sem capital 
  de giro próprio, restrições no acesso ao sistema financeiro 
  e muitas outras dificuldades decorrentes desta situação. Assim, 
  no que diz respeito aos meios de produção, a situação 
  que normalmente ocorre é a disponibilidade farta de mão-de-obra 
  mas sem acesso ao capital para tocar o negócio adiante. 
  
  No caso dos ativos fixos, diversas saídas foram encontradas pelos trabalhadores 
  para superar sua escassez, havendo atualmente uma série de mecanismos 
  públicos que permitem este acesso. Existe uma facilidade maior em disponibilizar 
  equipamentos e prédios para os trabalhadores já que, se o resultado 
  não for positivo, ainda restarão bens materiais como fruto do 
  projeto fracassado. As empresas autogeridas têm acesso a estes recursos 
  através de doações ou empréstimos do poder público, 
  ONGs e igrejas, ou através do arrendamento de plantas industriais diretamente 
  de seus proprietários ou ainda via judicial no caso de falências.
  
  O arrendamento de plantas industriais é o principal mecanismo utilizado 
  pelas empresas ligadas à ANTEAG. Essa situação geralmente 
  ocorre quando há uma falência ou a eminência de que isso 
  ocorra. É importante fazer um parêntese neste aspecto, já 
  que as empresas, muito antes de falir, costumam criar passivos várias 
  vezes superiores aos seus ativos. Na realidade, devido a uma série de 
  expedientes usualmente praticados, esta situação prejudica muito 
  menos os parceiros privados do que aos empregados e ao poder público. 
  Por vezes, mesmo o setor público não parece se sensibilizar com 
  as causas em questão. Esse é o caso de um curtume em Santo Ângelo/RS 
  onde as dívidas com fornecedores foram praticamente zeradas; restaram 
  uma dívida de R$ 15 milhões com o Banco Santander, herdada do 
  Meridional, outra de R$ 5 milhões com o Banco do Brasil e mais R$ 2 milhões 
  de dívidas trabalhistas. Apesar de o Banco do Brasil ser o síndico 
  da massa falida, impôs diversas dificuldades que acabaram por impedir 
  o arrendamento da planta.
  
  Os maiores empreendimentos autogeridos no país tiveram origem a partir 
  de processos como esse, tendo porém soluções mais bem sucedidas. 
  A Cooperminas, antiga CBCA, hoje com 400 sócios, situada em Criciúma/SC 
  e que desde 1917 produz carvão, vem sendo administrada desde 1987 pelos 
  trabalhadores permitindo uma série de avanços sociais para os 
  mineiros além da continuidade dos postos de trabalho até hoje 
  (ANTEAG, 2000). O caso é semelhante ao de muitas outras empresas, de 
  tamanhos diversos, chegando a gerar 4.000 postos de trabalho, num único 
  empreendimento. Para citar um exemplo recente de sucesso, dos cerca de 600 trabalhadores 
  que perderam os empregos em outubro de 2001 decorrentes da falência da 
  Companhia Geral de Fogões S.A., em Guaíba/RS, 150 estão 
  voltando a trabalhar neste mês de março de 2002, graças 
  a um acordo na justiça possiblitado por a um financiamento de R$ 600 
  mil reais concedido pelo Banrisul.
  
  Ainda no ponto sobre o controle dos meios de produção, uma situação 
  recorrentemente difícil de contornar têm sido a falta de capital 
  de giro. Como o ativo fixo, o capital de giro pode ser financiado por recursos 
  próprios ou por recursos de terceiros. Os recursos próprios destinados 
  ao financiamento do capital de giro, teoricamente, são aqueles que excedem 
  o capital imobilizado. É recomendável, portanto, que uma parte 
  do capital de giro seja financiada por recursos de longo prazo, próprios 
  ou de terceiros (MATARAZZO, 1998). Aqui é que os empreendimentos autogeridos 
  encontram as maiores dificuldades.
  
  Como já foi visto, os recursos próprios são bastante escassos. 
  Financiamento de longo prazo para capital de giro para indústria, no 
  Brasil, é usualmente difícil de se obter. O principal mecanismo 
  é o capital de giro associado a investimentos fixos oriundo de recursos 
  do PROGER e do BNDES. No entanto, como o nome já indica, estes recursos 
  representam uma fração do empréstimo destinado a investimento 
  fixo e as empresas nem sempre têm condições de acessá-los 
  ou necessidades imediatas de novos equipamentos. Já os recursos de curto 
  prazo exclusivamente destinados para financiamento do giro, vêm da carteira 
  comercial das instituições financeiras (com taxas de juro exorbitantes) 
  ou do crédito concedido pelos fornecedores. Ambos são difíceis 
  de se obter, especialmente no início do funcionamento dos empreendimentos 
  autogeridos, devido aos indicadores financeiros deficientes e agravado pelo 
  fato de que, no caso de falências, muitas vezes os fornecedores levaram 
  calote ou por pouco escaparam de ser caloteados pelo antigo dono. Com isso, 
  demora algum tempo para que se restabeleça a confiança do mercado 
  quanto às chances de sucesso do empreendimento. 
  
  Não raro essa situação é superada pelo comprometimento 
  pessoal dos novos administradores ou através do auxílio explícito 
  da sociedade. Infelizmente, no entanto, é comum ser esta dificuldade 
  superada sem recurso ao espírito da solidariedade, através da 
  simples prestação de - mais - serviços. Como a empresa 
  só dispõe de máquinas e de pessoal, produz com a matéria-prima 
  e a marca de terceiros. Apesar de a empresa ser democrática internamente, 
  os trabalhadores continuam sendo explorados por uma empresa externa que não 
  tem nenhuma obrigação legal com trabalhadores além da relação 
  comercial com a empresa autogerida (e que lhes pertence).
O outro lado do problema, ou seja, a educação e a organização 
  dos trabalhadores para gerir, de forma democrática, o seu negócio 
  é o que tem recebido maior atenção do movimento social 
  e dos intelectuais a ele ligados.
  “Na perspectiva de ser dono do negócio, surgia a dúvida: 
  o que é mais importante, ter o controle da gestão ou o controle 
  dos meios de produção? (...) Existem casos de os trabalhadores 
  gostarem tanto da gestão empresarial que assumem o controle da empresa 
  como gestores empresariais e se recusam a responder enquanto verdadeiros donos 
  coletivos da empresa. O caminho é educar os proprietários coletivos 
  para que assumam o controle da gestão. Não é por outra 
  razão que a Anteag investe 70% da sua força na educação 
  dos gestores. Não adianta ter o controle da empresa se não se 
  tem controle da gestão”. (ANTEAG, 2000; p. 22)
  Aqui parece que o recurso fundamental para que uma empresa autogerida obtenha 
  sucesso é a gestão do negócio. Sob uma ótica socialista, 
  o aprendizado dos trabalhadores em gerir empresas pode ser entendido como uma 
  finalidade em si já que, neste caso, a classe trabalhadora teria que 
  assumir coletivamente a operação da produção (SINGER 
  & MACHADO, 2000). Os operários sabem produzir mas este conhecimento 
  existe de forma fragmentada dentro de uma fábrica. Quem possui uma visão 
  integral é o gerente ou o proprietário. Para permitir a democratização 
  da gestão é necessária a apropriação coletiva 
  desse conhecimento, daquilo que a ANTEAG chama de saber coletivo dos trabalhadores 
  (ANTEAG, 1998). 
  
  A confiança é fundamental neste processo. Numa empresa convencional, 
  o que garante o emprego, muitas vezes, é o caráter tácito 
  das habilidades do trabalhador. Já numa empresa autogerida, o que irá 
  garantir a sua sobrevivência será a capacidade dos novos proprietários 
  reunirem um conjunto de informações dispersas e delas fazerem 
  sentido segundo seu interesse.. Ou seja, não havendo concorrência 
  entre os trabalhadores é seu interesse, se educarem uns aos outros naquilo 
  que conhecem e, especialmente, naquilo em que se complementam. Para uma fábrica 
  funcionar é necessário muito mais do que saber operar máquinas; 
  é preciso conhecer o mercado, organizar documentos, cumprir exigências 
  legais, estabelecer parcerias comerciais e institucionais. 
  
  A confiança, repetimos, é um ativo intangível dos mais 
  importantes neste processo. É ilustrativo o episódio de uma fábrica 
  do setor sucroalcooleiro no sul do país que, enquanto empresa convencional, 
  nunca havia atingido sequer 50% de ocupação da capacidade instalada. 
  Sua produção depende da matéria-prima produzida por pequenos 
  agricultores no entorno da planta industrial. Devido aos desmandos dos antigos 
  proprietários, os produtores rurais não plantavam tudo o que podiam. 
  A empresa faliu e os agricultores assumiram a usina junto com os ex-funcionários. 
  A gestão austera e a confiança adquirida em meio a importante 
  mobilização social (toda a comunidade depende, direta ou indiretamente, 
  daquele negócio) permitiram que a taxa de ocupação viesse 
  batendo recordes históricos até ultrapassar os 60% na última 
  safra. Para a próxima, já está garantido que este recorde 
  será superado novamente, devido à área plantada.
  
  Assim, a capacidade de gerir o negócio por parte dos trabalhadores tem 
  sido uma preocupação fundamental tanto das instituições 
  oriundas do movimento social quanto das políticas públicas da 
  área de economia popular solidária. Como já mencionamos, 
  as dificuldades encontradas aqui também são muitas. Não 
  custa enumerar aqui algumas das principais: o baixo grau de instrução 
  formal dos trabalhadores, o caráter inovador desta forma de gestão, 
  a fragmentação do conhecimento e o seu caráter tácito. 
  Este último aspecto é, talvez, a maior dificuldade dos técnicos 
  que assessoram tais empreendimentos. Nem sempre é possível se 
  fazer compreender pelos trabalhadores ou conseguir apontar precisamente os problemas 
  e soluções que viabilizarão o projeto. Há uma barreira 
  cultural pregressa, promovida pela lógica capitalista de produzir na 
  qual os trabalhadores, enquanto assalariados, estavam subsumidos e que tem se 
  revelado difícil de superar.
EFICIÊNCIA ECONÔMICA DAS EMPRESAS DE AUTOGESTÃO
Eficiência pode ser considerada uma medida da capacidade que agentes 
  ou mecanismos têm de melhor atingir seus objetivos, de produzir o efeito 
  deles esperados, em função dos recursos utilizados. O conceito 
  ortodoxo, expresso pelo ótimo de Paretto, vê como eficiente uma 
  condição onde os agentes maximizam suas funções 
  objetivo. Segundo ele, é eficiente, para a firma, maximizar o lucro ou 
  minimizar os custos de produção e, para o consumidor, maximizar 
  a satisfação ou minimizar as despesas. (MILLER, 1981) Estes conceitos, 
  da forma como vem sendo apresentados na teoria econômica, dependem de 
  funções objetivo contínuas e “bem comportadas”.
  
  A crítica mais contundente a este conceito de eficiência econômica 
  não vem dos economistas, mas da natureza (5). 
  O que dizer a respeito de eficiência econômica e satisfação 
  dos consumidores quando o que está em jogo são recursos não 
  renováveis? (6) As propostas decorrentes 
  das análises ortodoxas sobre a questão recomendam que se impute 
  um custo social para a poluição a ser pago, sob a forma de uma 
  taxa, pelas indústrias responsáveis pela mesma (BAUMOL & OATES, 
  1988). Se, por um lado, a taxação para emissão de efluentes 
  é cara demais para que os países desenvolvidos aceitem, por outro 
  lado é insuficiente para responder aos problemas hoje colocados. Senão, 
  o que dizer a respeito do que seria um imposto satisfatório para permitir 
  que grandes empresas acabem com as reservas de água potável do 
  mundo?
  
  Neste sentido, cabe notar que as associações de recicladores de 
  resíduos sólidos apresentam um exemplo importantíssimo. 
  No conceito de eficiência tradicional, ou seja, da relação 
  entre insumo e produto, estes empreendimentos são um grande fracasso. 
  O produto resultante do processo de coleta e triagem do lixo é muito 
  inferior aos custos de produção, só sendo viável 
  devido aos importantes subsídios públicos, sob a forma de coleta 
  e entrega dos resíduos nos galpões. No entanto, esta é 
  hoje uma política pública com aprovação praticamente 
  unânime na sociedade. O caso é que, além do plástico, 
  do papel, do vidro e dos metais, estes galpões produzem emprego, renda, 
  qualidade de vida, diminuição do volume de lixo em aterros sanitários, 
  redução no desmatamento, menos lixo nos arroios, reaproveitamento 
  de recursos que demorariam séculos para serem biodegradados, etc. Os 
  benefícios sociais daí resultantes não são remunerados 
  pelo mecanismo de mercado.
  
  Se eficiência diz respeito aos efeitos esperados, temos então que 
  encontrar uma forma de incluir nestes efeitos esperados pelas indústrias 
  não apenas mercadorias para a sociedade e lucro para o proprietário, 
  mas também postos de trabalho, qualidade de vida, preservação 
  ambiental e valorização do ser humano. Tais questões não 
  podem ser colocadas como sendo juízos de valor, fora do escopo do estudo 
  das Ciências Econômicas. Deste modo, a discussão sobre o 
  conceito de eficiência econômica envolve um debate que diz respeito 
  não somente à rentabilidade das empresas mas também aos 
  benefícios sociais por elas gerados, sendo aceitável que o poder 
  público as subsidie, de alguma forma, para que possam competir no mercado.
  
  Nem todas as empresas autogeridas, porém, dependem de subsídios 
  para competir. Muitos são os casos em que estas foram capazes de ser 
  mais rentáveis do que empresas convencionais que as antecederam, mesmo 
  sob condições mais adversas. Essa situação fica 
  mais evidente num contexto de falência, onde a gestão tradicional 
  levou a empresa ao fracasso e, quando arrendada por iniciativa dos ex-funcionários, 
  conseguiram se reerguer.
  
  Esse foi o caso de uma empresa do setor têxtil que formou uma cooperativa 
  com cerca de 100 trabalhadores que perderam o emprego no processo de falência. 
  Esta empresa conseguiu, em menos de 3 anos, acumular recursos próprios 
  de tal ordem que permitiram que a cooperativa comprasse a planta industrial 
  da massa falida através de um leilão judicial. A diferença 
  foi apenas de gestão, como em muitos outros casos fica a dúvida 
  se a antiga direção era fraudulenta ou apenas incompetente. Este 
  não é um caso isolado de sucesso e pode-se enumerar exemplos de 
  setores econômicos variados como o calçadista, o metal-mecânico, 
  o alimentício e outrosApesar dos fatores que determinaram o sucesso de 
  empresas autogeridas onde outras fracassaram ainda merecerem melhor aprofundamento, 
  já é possível identificar alguns deles. O primeiro é 
  que, como já indicado acima, a legislação tributária 
  e a legislação trabalhista facilitam as fraudes e a má 
  fé e, em especial, a legislação comercial e a lei de falências 
  dificultam a comprovação de fraudes que dilapidam o negócio. 
  Bancos públicos também costumam fazer negócios duvidosos 
  com empresas às vésperas de fechar suas portas. Assim, quando 
  uma empresa fecha, os principais credores freqüentemente são os 
  trabalhadores, o erário e as instituições financeiras públicas. 
  Quando uma empresa autogerida consegue arrendar na justiça uma dessas 
  planta, além de manter os postos de trabalho e o patrimônio da 
  massa falida, o fato em si também costuma representar uma dificuldade 
  a mais para os fraudadores.
  
  De fato, os determinantes para a obtenção do sucesso comercial 
  são bastante diversos. Um deles é que, como donos, os trabalhadores 
  têm diversos motivos a mais para se empenhar em seu trabalho. É 
  fato que as pequenas melhorias, ou inovações, feitas no cotidiano 
  da fábrica, melhorando a qualidade, a produtividade e reduzindo o desperdício 
  são fontes importantes de competitividade nos dias de hoje (TAUILE, 2001a). 
  Se estas melhorias revertem de fato em favor dos trabalhadores, estes têm 
  muito mais interesse em realizá-las. Outro fator é que a remuneração 
  e a própria manutenção dos postos de trabalho dependem 
  do desempenho destes trabalhadores no sentido de aumentar competitividade. 
  
  No Brasil, a utilização da força de trabalho vem ocorrendo 
  de maneira predatória. O mercado de trabalho não valoriza devidamente 
  a qualificação dos trabalhadores, a rotatividade é mantida 
  em níveis absurdamente altos como forma de disciplinar os trabalhadores 
  e os salários são bastante baixos se comparados com a maioria 
  dos países em desenvolvimento. Assim, a flexibilização 
  do trabalho tem sido entendida por aqui como precarização das 
  relações de trabalho (CARVALHO, 1994). Nas empresas de autogestão, 
  o objetivo de flexibilizar a produção deve ser mantida, mas sem 
  precarização, com baixa rotatividade e manutenção 
  do número e da qualidade dos postos de trabalho, diferentemente do que 
  vem ocorrendo tradicionalmente no setor produtivo.Apesar dos muitos exemplos 
  de sucesso, não existe uma sistematização sobre quais são 
  as condições que o favorecem. Por ora, só é possível 
  concluir o aspecto eficiência econômica da autogestão com 
  a enumeração de condições sob as quais esta forma 
  de organização da produção apresentou desempenho 
  especialmente satisfatório. As empresas de autogestão têm 
  sido mais eficientes quando se trata de coibir gestões empresariais incompetentes, 
  fraudulentas e gananciosas (no sentido de proprietários que estabelecem 
  sua própria remuneração em patamares incompatíveis 
  com a capacidade da empresa, extraindo uma mais valia excessiva). Ainda outro 
  aspecto interessante e digno de nota, é a capacidade que a autogestão 
  teve de introduzir maior flexibilidade em fábricas com gestão 
  e equipamentos antigos; em diversos casos, fábricas praticamente obsoletas 
  apresentam indicadores econômicos superiores a suas concorrentes convencionais 
  com equipamentos melhores. 
  
  No caso específico das falências, muitas delas estão associadas 
  a dívidas que se acumularam a longo de anos e que acabam por impor um 
  custo financeiro insuportável. Quando os trabalhadores assumem a planta, 
  geralmente o fazem através de arrendamento, sem assumir as dívidas, 
  o que é um bom negócio para todos já que, além de 
  preservar postos de trabalho, reduz significativamente os custos da massa falida 
  e valoriza o patrimônio, beneficiando os credores (entre os quais os próprios 
  trabalhadores). É evidente que estas observações ainda 
  carecem de maior sistematização; porém, dado o acúmulo 
  existente e a oportunidade (e a necessidade) de divulgá-las, parece ser 
  a avaliação possível neste momento.
POLÍTICAS PÚBLICAS BRASILEIRAS PARA ECONOMIA POPULAR SOLIDÁRIA
Se a autogestão tem de fato tamanho potencial de beneficiar a sociedade 
  brasileira, parece evidente a necessidade de o poder público fomentá-la, 
  suprindo as deficiências que ela apresenta em seus estágios iniciais 
  no Brasil. Entre as experiências mais importantes de políticas 
  públicas para a economia popular solidária no meio urbano pode-se 
  citar o Programa Economia Popular Solidária (EPS) do Estado do Rio Grande 
  do Sul, os programas de algumas prefeituras brasileiras e as incubadoras de 
  cooperativas populares existentes em diversas universidades públicas 
  e privadas.
  
  O programa gaúcho é o mais abrangente em número de empresas 
  e trabalhadores envolvidos. Também é o mais ambicioso em termos 
  de objetivos propostos. O Programa EPS, ligado à Secretaria do Desenvolvimento 
  e dos Assuntos Internacionais (SEDAI), foi constituído através 
  de decreto do Governador. Para participar do programa, as empresas devem se 
  constituir sob a forma de cooperativa, sociedade por cotas, associações 
  ou sociedades anônimas de capital fechado. Também podem participar 
  grupos em processo de formalização. Outras exigências são: 
  a democracia na gestão e na propriedade, remunerar o trabalho de forma 
  privilegiada em relação ao capital, não ter empregados 
  em número superior a 10% ao do total de associados e ter mais de 5 sócios 
  (RIO GRANDE DO SUL, 2001a).
  
  Os instrumentos criados por estas políticas públicas ainda são 
  incipientes, mas começam a ganhar força e objetividade. Pode-se 
  dividir os instrumentos existentes ou em elaboração em 5 eixos, 
  como no programa gaúcho (RIO GRANDE DO SUL, 2001b):
  - Formação e educação em autogestão;
  - Capacitação do processo produtivo;
  - Financiamento;
  - Comercialização;
  - Incubadoras de economia popular solidária.
Os eixos de formação e educação em autogestão 
  e capacitação do processo produtivo, que o Governo gaúcho 
  achou por bem distinguir, são tratados conjuntamente pela maioria das 
  políticas públicas e ONGs da área. Assim é que a 
  ANTEAG foi chamada a contribuir com a SEDAI por possuir um programa de educação 
  entre os mais reconhecidos, contando com 10 cadernos que abordam problemas técnicos 
  de maneira simples e do ponto de vista da autogestão. A exemplo da ANTEAG, 
  as incubadoras ligadas às universidades também oferecem assessoria 
  técnica específica e cursos por empresa , o mesmo acontecendo 
  com as Prefeituras. Esse é, portanto, o eixo mais disseminado e busca 
  suprir a deficiente educação formal e a falta de experiência 
  em administrar por parte dos trabalhadores envolvidos.
  
  No Rio Grande do Sul, o que aqui é chamado de capacitação 
  do processo produtivo, foi delegado a técnicos ligados a diferentes universidades, 
  com formação nas áreas de Economia, Administração, 
  Contabilidade e Engenharia. Estes técnicos prestam assessoria técnica 
  para a gestão dos negócios e elaboração de projetos 
  de financiamento, em colaboração com os monitores técnicos, 
  pessoal com experiências diretamente relacionadas à autogestão.
  
  No aspecto de financiamento, existem diversas ONGs que oferecem fundos para 
  pequenos projetos, sendo a Cáritas uma das mais importantes. Também 
  vêm crescendo as instituições de microcrédito com 
  apoio de diversas Prefeituras Municipais e participação do BNDES. 
  A questão é que estes recursos são mais voltados para empreendimentos 
  familiares ou de serviços e dificilmente resolvem problemas de plantas 
  industriais. Técnicos do BNDES têm buscado formas de oferecer crédito 
  para estas empresas mas esbarram na dificuldade de adequar às exigências 
  legais e às normas internas daquele banco de investimento, os procedimentos 
  e os indicadores de desempenho econômico relativos às (entidades 
  e) empresas solicitantes. Vale destacar que, igualmente, o Banrisul e a SEDAI/RS 
  criaram linhas de crédito especiais para o setor, além de disponibilizar 
  técnicos para elaboração do projeto e acompanhamento da 
  execução. Tais esforços trouxeram avanços significativos 
  mas ainda existem algumas dificuldades na questão das garantias reais 
  e da disponibilidade de capital de giro. Assim é que este crédito 
  é oferecido às empresas com capacidade de pagamento, ou seja, 
  com rentabilidade positiva. O setor industrial (ainda) não conta com 
  subsídios semelhantes aos que os agricultores costumam receber, com taxas 
  de juros bastante mais reduzidas, às vezes negativas, até mesmo 
  para capital de giro.
  
  O aspecto comercialização ainda é o mais frágil, 
  ao menos, no setor urbano da economia popular solidária. No setor rural, 
  menos complexo em termos do número de processos envolvidos, existem redes 
  que conseguem levar do produtor ao consumidor, passando por uma agroindústria 
  solidária, sem intermediários. No setor de serviços, algumas 
  incubadoras conseguiram abrir as portas das universidades na prestação 
  de serviços terceirizados. Já para as iniciativas autogeridas 
  da indústria de transformação, excluindo o setor de alimentos, 
  ainda não se tem resultados satisfatórios.
  
  É neste contexto que se carece de estímulo para a constituição 
  de redes de comunicação que, através espaço cibernético, 
  unam as empresas autogestionárias, permitindo que não só 
  aufiram economias de escala no que tange a compras e vendas (dentro e fora da 
  rede) como também desenvolvam economias de solidariedade que viabilizem 
  complementar competências e suprir deficiências deste subconjunto 
  expressivo da chamada economia solidária no Brasil. A política 
  de constituição de redes pode cobrir diversos aspectos além 
  do comercial, articulações entre empresas e instituições 
  podem ser úteis na difusão de tecnologias e apoio político-institucional 
  para o setor. Estes últimos são especialmente importantes para 
  empresas situadas em pontos mais avançados de cadeias produtivas complexas, 
  ou seja, que produzem bens intermediários e bens de capital. Para estas, 
  a economia popular solidária não apresenta (ainda) uma densidade 
  comercial significativa mas o apoio de instituições como o judiciário 
  e o poder público municipal e a troca de informações com 
  outras empresas são questões fundamentais.
  
  As incubadoras de economia popular solidária talvez sejam a política 
  pública mais difundida. As incubadoras, normalmente criadas pela comunidade 
  universitária, oferecem formação, acompanhamento e alguma 
  estrutura física para que as empresas iniciem. A ênfase destes 
  projetos também é naqueles serviços mais populares, tendo 
  alguma dificuldade para oferecer assessoria a empreendimentos industriais.
  
  Como pode-se notar, apesar de nem sempre serem suficientes, existem iniciativas 
  do poder público que mostram preocupação com as principais 
  dificuldades apresentadas pelos empreendimentos autogeridos. Todavia, ainda 
  falta muito para que as políticas públicas consigam extrair todo 
  o potencial econômico e social deste movimento. É fundamental que 
  estas políticas partam de análises mais aprofundadas da realidade 
  vivida pelos empreendimentos, que tenham mais agilidade para responder aos problemas 
  no momento que estão ocorrendo e que sejam mais disseminadas pelo país. 
  Não obstante os pertinentes mas breves exemplos aqui anotados, para que 
  os instrumentos de intervenção ganhem em qualidade, é necessário 
  que as principais dificuldades sejam melhor catalogadas, classificadas e explicadas 
  de modo que se possa criar ou encontrar meios de ação mais apropriados 
  para que o poder público possa agir direta e eficientemente sobre suas 
  causas. Avançou-se muito nos últimos anos e existem muitas soluções 
  disponíveis na esfera institucional, no entanto, freqüentemente 
  estes mecanismos carecem de uma coordenação mais apurada entre 
  si.
CONCLUSÕES
À luz do exposto a questão central parece ser discussão 
  sobre a viabilidade da expansão desta forma social de organização 
  da produção no ambiente do capitalismo contemporâneo. Diante 
  da importância do tema, a carência de informações 
  e a deficiência de análises apontadas justificam a atenção 
  e o esforço de trabalhos posteriores. Muitas são as dificuldades 
  enfrentadas por estes empreendimentos, conhecê-las melhor é fundamental 
  para se aumentar as possibilidades de superá-las.
  É necessário aprofundar o debate em duas direções, 
  a primeira diz respeito às condições sistêmicas para 
  o crescimento da economia popular solidária. A outra direção 
  é estudar as questões internas às firmas, suas particularidades 
  e como gerí-las de forma que o sucesso econômico não acabe 
  em fracasso da autogestão e vice-versa. Em outras palavras, não 
  é suficiente para as empresas de autogestão, do ponto de vista 
  de seus sócios-trabalhadores, que estas apresentem rentabilidade excelente; 
  este objetivo deve ser alcançado sob uma gestão democrática, 
  com a manutenção e criação de postos de trabalho 
  e com qualidade de vida para aqueles que participam do projeto.
  Também é necessário contruir modelos que permitam compreender 
  melhor este movimento e que sirvam para orientar o poder público sobre 
  como atuar. As políticas para o setor surgem de forma um tanto espontânea 
  como decorrência das dificuldades em obter os recursos necessários 
  e a partir da pressão exercida pelos setores da sociedade ligados a este 
  tema. É preciso desenhar melhor os instrumentos e combiná-los 
  de forma adequada pois, muitas vezes, a demora em oferecê-los dificulta 
  a obtenção das sinergias planejadas. A solução certa 
  no momento errado pode não resolver o problema a que se propõe 
  e, às vezes, pode até agravá-lo.
  Apesar de tudo, os resultados positivos que vêm sendo acumulados pelos 
  trabalhadores nesse processo não são nada desprezíveis. 
  Esta é, ainda, uma das formas mais baratas de gerar/manter postos de 
  trabalho, especialmente no setor industrial. Os exemplos citados aqui representam 
  apenas uma pequena amostra dos frutos que vêm sendo - e ainda podem ser 
  -colhidos, dado que este é um processo em estágio ainda inicial. 
  O objetivo daqueles que participam deste esforço é ver o dia em 
  que pessoas, máquinas e prédios não fiquem desempregados 
  por razões jurídicas ou falhas nos mercados.Num país subdesenvolvido 
  como o Brasil, imaginar que fábricas possam ficar paradas por questões 
  jurídicas ou que pessoas motivadas e qualificadas não tenham trabalho 
  por falta de apoio institucional é lamentável; mas não 
  podem ser desanimador 
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_________
  Notes : 
  (1) : Professor titular do IE/UFRJ. Texto escrito em março de 2002; esta 
  é ainda uma versão preliminar. / Revenir au texte
  (2) : Analista de Projetos do BRDE. Economista pela UFRGS e Mestre em Economia 
  pelo CAEN/UFC. / Revenir au texte
  (3) : Às vésperas da conclusão deste, o professor Luís 
  Argemiro Brum da UNIJUÍ, publicou um breve artigo sobre o assunto na 
  Gazeta Mercantil de 13/3/2001 “Economia Solidária: elementos para 
  compreensão”. Apesar das semelhanças no tratamento de algumas 
  questões, vale notar que os trabalhos foram produzidos de forma totalmente 
  independente. / Revenir au texte
  (4) : O patrimônio líquido é a conta no balanço patrimonial 
  que, situada do lado da origem dos recursos, aponta qual o volume de recursos 
  da empresa vem de fontes próprias. Estas fontes são, basicamente, 
  o capital social integralizado pelos sócios no início do negócio 
  mais os resultados (lucros ou prejuízos) acumulados ao longo da vida 
  da empresa. O patrimônio líquido é uma importante conta 
  na análise da estrutura patrimonial das empresas, já que, em comparação 
  com outras contas, indica o grau de autonomia da mesma./ Revenir 
  au texte
  (5) : O que não deixa de ser interessante dada a origem positivista da 
  escola neoclássica. / Revenir au texte
  (6) : O conceito de recurso natural não-renovável não inclui 
  a água potável, por exemplo, mas há um debate mundial sobre 
  a escassez desta. / Revenir au texte